Quem disser que não se assustou ao saber, na última segunda-feira, que Elon Musk comprou 9,2% de ações do Twitter, mente. Enquanto todo o mercado parava por alguns (ou muitos) momentos para tentar entender a motivação dessa compra, confesso que corri para ver a minha carteira de investimentos, a qual boa parte é formada por ações do Twitter. E olha… por mais que eu goste de criticar Elon Musk, não posso dizer que a última segunda-feira tenha sido má.
Passado o susto inicial, começaram a surgir alguns detalhes sobre a aquisição. Primeiro, um detalhe muito técnico: Elon Musk registou a compra das ações junto ao SEC sob a categoria 13G, sendo a categoria para quando alguém compra um grande volume de ações de uma empresa sem a intenção de participar ativamente ou de influenciar a operação da companhia. Isso pareceu bastante estranho, considerando o facto de Elon Musk ser incapaz de guardar qualquer opinião que lhe ocorre, mas os factos eram esses. Porém, antes mesmo do dia acabar, Musk perguntou a seus 80M de seguidores se eles gostariam que o Twitter lançasse um botão de editar tweets. Isso, para muitos, já pareceu uma espécie de ativismo, ainda que inofensivo (afinal, a resposta da maioria seria, previsivelmente, “sim”).
No dia seguinte, veio a segunda bomba: Elon Musk é o novo membro do conselho do Twitter. Para alguém que não tinha aspirações ativistas, virar conselheiro após comprar quase 10% da empresa definitivamente não parece estar em linha com essa intenção. Tanto que, no dia seguinte, Musk trocou o registo 13G para 13D no SEC, que é o registo adequado para quando o investidor tem a intenção de participar ativamente ou influenciar a operação da empresa. Assim, pareceu bem mais adequado para todos nós que conhecemos o modus operandi de Elon Musk.
Quanto mais eu penso sobre este assunto, mais essa compra parece-me óbvia. Apesar do seu valor social e da sua influência por todo o mundo, o Twitter é uma das empresas de menor valor no vale do silício. Mais do que isso, o Twitter perdeu mais de 50% de valor no último ano, com as ações a valer uns míseros US$32. Considerando que, em 2013, o Twitter havia estreado na bolsa valendo US$41 por papel, a compra das suas ações andava uma “pechincha” nos últimos dias, quando elas estavam em queda livre.
O que me levaria a crer que a compra foi uma movimentação puramente comercial, de um investidor que estava a ver uma empresa incrivelmente desvalorizada frente à influência mundial que o seu produto exerce, e a seu potencial. As ações foram vendidas com desconto, e Musk aproveitou. Eu (e muitos outros) poderíamos crer isso, não fosse um detalhe importantíssimo sobre essa história: todos os problemas nos quais Elon Musk se meteu nos últimos anos, envolveram os seus tweets e o SEC. Após ter mentido no Twitter que tornaria a Tesla uma empresa privada por um valor maior do que o que ela estava a valer naquele momento, a Tesla valorizou alguns biliões de dólares, e Musk teve de pagar uma multa. Mais do que isso, ficou definido que ele não poderia mais publicar nenhum tweet a respeito das operações da empresa, o que obviamente não aconteceu. Então nos últimos anos, nós que frequentamos o Twitter temos visto um sem-fim de publicações que Musk faz sabendo que irritará o SEC, mas que da mesma forma ele sabe que não trarão nenhuma consequência real.
Mais do que isso, Musk vinha a tweetar de forma cada vez mais agressiva contra o SEC ao mesmo tempo que vinha a comprar, diariamente ao longo de março, esses 9,2% do Twitter. Em última instância, Musk comprou uma cadeira na liderança da empresa que, para acatar um eventual pedido do SEC para impedi-lo de tweetar, teria que discutir a decisão com… o painel do qual agora ele faz parte!
Por fim, existe a hipótese que, por ser a mais óbvia, apela para o meu senso de que a navalha de Occam pode mesmo existir: talvez Elon Musk esteja genuinamente farto de ver o Twitter patinar em questões simples de mercado, e resolveu fazer algo a respeito. Musk, assim como muitos de nós, parece importar-se com o Twitter, apesar dos seus métodos e a sua forma de expressar ser, muitas vezes — e como eu já disse aqui — além de fétida. Como observador do mercado de tecnologia, vejo essa compra como uma movimentação interessante e que realmente pode ajudar o Twitter a encontrar um caminho para o crescimento. Afinal, uma empresa com crescimento negativo num intervalo de 9 anos, enquanto as outras valorizaram entre 350% (como no caso do Facebook) e 3.400% (como no caso da Tesla) neste mesmo período definitivamente parece estar a precisar de ajuda. Como utilizador do Twitter, fico bastante preocupado com a influência desproporcional que Elon Musk poderá ter no conselho, especialmente considerando a hipótese dele estar a ver o novo CEO, Parar Agrawal, como uma presa fácil para manipular, dominar, e Musk tornar-se o real CEO da companhia (ainda que indiretamente). Como investidor, bem, como investidor confesso que agora não tenho muito de reclamar. Adicionar à liderança alguém que proporcionou um crescimento de 3.400% à própria empresa num intervalo de 9 anos, e de 26.400% desde o IPO, parece ser uma situação atraente.
O problema está, claro, na tentativa de conciliar todas essas visões. Mas se a análise da tecnologia ensinou-me algo nos últimos anos, é que enquanto tudo sobre a sua existência se baseia apenas entre algo ser 0 e algo ser 1, as consequências disso são infinitas e, por vezes, bastante contraditórias.